quinta-feira, 4 de novembro de 2010

ROMARIA DOS MÁRTIRES EM CARMO DO RIO VERDE: NATIVO VIVE!

Oi,Irmãos,
segue este relato da Romaria dos Mártires,sei qaue vocês espalham boas noticias.
Abração:
Zé Vicente

Já era mais de 19:00 horas do dia 22 de outubro, mas o sol, no horário de verão,ainda piscava pra lua cheia que despontava graciosa sobre a cidade de Carmo do Rio Verde em Goiás.
No pátio do Cemitério, uma celebração diferente,coordenada pelo Pe. Welligton e equipe, reunindo numa grande roda,mais de 120 pessoas, entre parentes muito próximos, companheiros e amigos de Nativo da Natividade, então Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais,morto a tiros, no dia 23 de outubro de 1985.
Após a saudação do espaço e das pessoas presentes, algumas levando flores, velas, sementes, a bíblia sagrada, cruz... Ouvimos testemunhos serenos, emocionados e marcantes, do filho Eduardo, da esposa Maria de Fátima, de irmãos, companheiros do Sindicato.
- “O Nativo, desde criança,lá na roça, era um menino muito inquieto. Nossa mãe sempre se preocupava com ele,dizendo que ele era revoltado com as coisas erradas...”, diz um dos irmãos,com emoção.
- “ele era amigo da gente, tratava a gente com atenção,encorajava.Tinha coisas boas,reuniões...sinto saudades, saudades daquele tempo” – murmurou uma Senhora cabocla, num recanto da grande roda, entre soluços.
- “entre tantas viagens, ele sempre chegava,dando atenção pra nós,os filhos,cumprindo as obrigações da família. Eu não pude compreender direito aqueles acontecidos,tinha só 10 anos,quando mataram meu pai.Hoje vejo mais claro a importância dele na vida da gente”, fala Eduardo, o filho,que nos marcou a todos, pela serenidade e consciência de justiça, que transmitiu em todos os momentos dos quais participou.
Vários companheiros, lideranças sindicais, chamaram a atenção para as conquistas conseguidas, frutos das lutas daquele período,em que Nativo empunhou bandeiras tão urgentes – direitos dos trabalhadores nos canaviais da região, reforma agrária, denuncia contra o avanço da destruição da natureza,redemocratização do Brasil, que ainda vivia sob o regime da ditadura militar que dominou o país de 1964 a 1985. Trouxeram também a lembrança, de outros mártires da mesma causa e do mesmo período,em Goiás: Sebastião Rosa da Paz, Vilmar etc.
Com o brilho da lua e de algumas velas, foi proclamado o Evangelho,seguido de uma caminhada em silêncio até o túmulo de nosso mártir-herói, Nativo, onde foi descerrada uma placa comemorativa, pelos 25 anos de memória do seu assassinato. Com os cantos “Prova de amor maior não há...” e “Vitória, tu reinarás, ó cruz tu nos salvarás”, foi encerrada a primeira celebração da IV Romaria dos Mártires da Diocese de Goiás.


O DIA 23, ROMARIA EM CLIMA DE CHUVA E MUITA FÉ...

Logo cedo,dia nublado,com algumas pancadas de chuvas,uma nova celebração, na Igreja Matriz de N.Sra. do Carmo, que esteve quase cheia de gente. Também num clima orante e testemunhal.
Ali, o destaque mais simbólico,foi o anúncio do nascimento da netinha de Nativo e Fátima,nessa véspera do jubileu pascal do avô. O aplauso da Assembléia confirma a importância sagrada da bandeira maior a ser empunhada, sempre, por todos nós: a VIDA!
Ali,pude cantar em coro com tantos parentes da caminhada, o canto que compus naqueles dias,de tantas lutas e cantares:
“Venham todos,cantemos um canto que nasce da terra,canto novo,de paz e esperança em tempos de guerra... Lavradores,Raimundo,José,Margarida, Nativo...assumir sua luta e seu sonho por nós é preciso!”
O período da tarde, foi marcado pela realização do DNJ – Dia Nacional da Juventude, que reuniu algumas centenas de jovens, num só grito conta a violência e o extermínio de jovens. Os participantes realizam uma passeata até a praça central, de onde partiu a grande caminhada, até a frente do Sindicato,onde Nativo foi executado.Com três paradas,quando eram erguidos estandartes com rostos de vários irmãos e irmãs mortos pela violência daqueles que se acham donos da terra e da vida de pessoas.Foi emocionante a parada anterior a proclamação, por um jovem ator, do texto do Apocalipse,quando foram lidos resumos das histórias das pessoas martirizadas e aclamados seus nomes e suas presenças vivas entre nós.Repetimos, várias vezes, o refrão: “Vidas pela Vida,vidas pelo Reino!”
Cerca de 10 mil pessoas,entre os (as) caminhantes e quem acompanhava de suas casas,participaram, da celebração final, presidida pelo bispo de Goiás, D.Eugênio, concelebrada por D. Messias,bispo de Uruaçu e D. Tomaz Balduíno, bispo emérito, que com mais de 80 anos, fez todo o trajeto da caminhada a pé e ainda teve fôlego pra proferir uma homília vibrante. O ofertório foi aberto pela entrega do lenço ensangüentado de Nativo,pela esposa e o filho, a Dom Eugênio, que prometeu que será posto em lugar de destaque na sede da diocese.
Após a missa, eu,juntamente com a cantora Eliane Brasileiro e o músico Heriberto Silva, convidados para a Romaria, animamos aquele momento de cantos,danças e partilha de alimentos preparados para a festa da comunhão.
A certeza de que o sonho bom e teimoso, que moveu a entrega da vida de Nativo da Natividade e tantas outras pessoas, no decorrer de nossa história, é que revela o sentido profundo do seu sangue sobre o chão,apontando-nos o rumo da caminhada para a conquista da terra livre e da reforma agrária verdadeira, da justiça aos mandantes e criminosos impunes, do fortalecimento da fé e da coragem da gente, da chama da profecia a ser mantida sempre acesa nas comunidades e em quem assume a missão de pastores, líderes da classe trabalhadora e governantes de nossa nação brasileira.

Viva Nativo Vivo!
Fortaleza,03 de novembro de 2010

Zé Vicente – contato: zvi@uol.com.br