O incômodo dos pobres nas ricas Igrejas
Bom, pela estrutura física do templo e pela assembléia, percebi logo que participaria de uma celebração litúrgica monótona, ritualista, totalmente desprovida de animação, de inculturação, como estou acostumado a vivenciar em nossas comunidades no Ceará.
Gostaria, no entanto, de destacar algumas situações que assisti nesta “solene celebração”. Enquanto o padre dirigia à assembleia sua homilia, entrou na Igreja um homem, visivelmente pobre e bêbado e dirigiu-se para perto do altar, parando ao lado do primeiro banco. O leitor já pode imaginar como ficaram os participantes daquela celebração, de olhares repreensivos e, ao mesmo tempo, curiosos para saber o que faria aquele pobre homem. Os cochichos imediatamente ecoaram pela Igreja.
O padre, vendo aquele homem ali parado sob os olhares de todos, até que ainda convidou-o a entar-se. Era o mínimo que poderia fazer. Porém, como o homem não sentou, dirigiu à assembléia a pergunta mais absurda que um sacerdote poderia fazer durante uma celebração eucarística, ao confrontar-se com uma situação daquelas: “E agora, o que é que eu faço?” O padre não sabia o que fazer com aquele homem ali parado, um pobre, bêbado, que passara por ali com certeza para pedir esmolas, pois não morava naquele bairro, que era de classe alta. O padre silenciou e, após alguns instantes, o homem sentou-se numa vaga que havia no primeiro banco. Aquele senhor, que já aparentava ter mais de 50 anos, não cometeu erro nenhum dentro da Igreja, apenas passou pelo corredor central e sentou-se no primeiro banco.
Porém, o homem era pobre e aquela Igreja não estava acostuma a receber pobres em suas missas. Por isso, apenas a presença dele no meio daquela assembléia de elite já foi um grande incômodo, principalmente para o padre, que não sabia o que fazer com ele. Um jovem, que parecia ser funcionário da paróquia, mas não tenho certeza, dirigiu-se ao senhor e tentou tirá-lo da Igreja. O homem resistiu e o jovem saiu. Não satisfeito, o jovem retornou após alguns minutos e o convenceu, não sei com que palavras, a sair da Igreja. As faces dos presentes voltaram à tranquilidade.
Este fato parece simples, mas questiona por inteiro o nosso seguimento a Jesus. Os preferidos de Deus são impedidos de permanecer na casa que nós propalamos que é de Deus. Esquecemos que foi o próprio Jesus Cristo que disse: “Em verdade eu vos declaro: todas as vezes que o fizestes a um destes mais pequeninos, que são meus irmãos, foi a mim que o fizestes” (Mt 25, 40).
Muitas de nossas paróquias seguem a lógica do capitalismo e, aqueles que deveriam ocupar os primeiros lugares, são marginalizados, porque não tem dinheiro, não se vestem bem, não ocupam altos cargos e não podem dar uma oferta “gorda” nas missas. A cegueira toma de conta e muitos não conseguem enxergar Jesus nestes homens e mulheres, deixando passar uma ótima oportunidade para fazer justiça aos injustiçados deste mundo e construir o Reino de Deus.
Parece-me que estamos cada vez mais distante do projeto de vida e libertação pregado por Jesus de Nazaré. As nossas atitudes diante dos pobres comprovam esta distância e a nossa falta de compromisso. Quando muito, assumimos uma atitude assistencialista diante dos pequenos, dando-lhes esmolas vergonhosas quando nos pedem, quando batem em nossas casas paroquiais ou se achegam em nossas Igrejas luxuosas. Gasta-se mais dinheiro em reformas, compra de vestes e objetos litúrgicos caríssimos do que com as obras de caridade e a luta pela justiça.
Aquele homem ocupou o lugar que lhe era de direito: o primeiro banco. Porém, foi retirado não para o último, mas para fora da Igreja. Perdemos as oportunidades de nos tornarmos os “benditos” dos quais Jesus fala em sua pregação (cf. 25, 34).
Ao final da celebração, fui falar com o padre e disse-lhe: “Você não me conhece e eu não te conheço, mas da próxima vez, não deixe que tirem um pobre da missa que estiveres celebrando”. O reverendíssimo sacerdote dirigiu-me, meio atônito com o comentário que eu fiz, outra pergunta absurda, como se não lembrasse da cena que se passou diante de seus vivos olhos a minutos antes: “Quem foi que tirou?” O rapaz, porém, não encontrei-o mais.
Consola-nos e alimenta a nossa rebeldia as Bem-Aventuranças do Reino (cf. Mt 5, 3-12), que proclamam felizes os pobres e excluídos de nossas Igrejas, desta sociedade.
29 de agosto de 2008
CPT CE