segunda-feira, 19 de outubro de 2009

AS CEBS FORAM DESCARACTERIZADAS EM FUNÇÃO DE UM NOVO MODELO ECONÔMICO ECLESIAL



Houve um tempo em que esta sigla, composta por quatro letras, significava muito para a Igreja Católica e para o povo, mais precisamente na década de setenta, época em que o regime militar desbravava sua impiedosa ideologia. Movimentos sindicais, trabalhadores rurais, operários e outras formas de organização popular, encontravam nas Comunidades Eclesiais de Base impulso e alento para enfrentar o período de opressão. Reunidas em torno da palavra de Deus refletiam sobre a realidade local e sentiam-se encorajadas em reivindicar melhorias para a vida comunitária, incorporavam campanhas de apoio aos necessitados, engajavam-se nas lutas dos sem-terra, dos operários e dos camponeses que almejavam a reforma agrária. Uma vivência autêntica da dimensão sócio transformadora, embalada pela então polêmica teologia da libertação(...)

A Igreja respondia às atitudes deploráveis que marginalizavam a sociedade, encarnava-se para atender aos apelos evangélicos, encontrando nas CEBs a eficiência de um dinâmico processo catequético.

A quem diga que elas desapareceram, mas o fato é que a “visível atuação das CEBs”, infelizmente não atravessou décadas, elas caíram num “proposital esquecimento de uma parcela da estrutura eclesial” no que se fez suscitar novos movimentos condizentes com a econômica forma de atuar da Igreja, sufocando a importância e os ensinamentos ofertados nas CEBs, vividos em momentos cruciais da sociedade. Um período de injustificável indiferença a todo e qualquer tipo de transformação dentro e fora das estruturas eclesiais. Apesar de uma forte resistência dos militantes remanescentes, foi impossível evitar a “descaracterização” das Comunidades Eclesias de Base, que passaram a se reunir em torno da pintura do templo, do dízimo, de um arcaico ensinamento catequético e das inexpressíveis festas de seus “sustentáveis padroeiros” marcados por procissões e leilões.

Onde ficaram as reuniões que tratavam da reforma agrária? Dos sem-teto? Por que a maiorias dos nossos pastores não enfatizam a doutrina social em suas homilias (antigos sermões)? E o derramamento de sangue e suor de seus incontáveis mártires?
Cabem aqui as palavras do escritor Leonardo Boff, que ao tratar dos questionamentos sintetiza a discussão: “Nada mais problemático do que uma descendência sem memória. Daí a necessidade de retomarmos continuamente o fio histórico dos acontecimentos para seguir em frente com tranqüilidade e profecia”

Não tem sido fácil manter viva uma histórica nomenclatura, que muito significa para a estabilização do Reino. O contínuo retorno mencionado por Boff transporta sonhos e vontades que confluem para a soberana hierarquia da Igreja. Uma visão imutável e construtora de um novo modelo que faz descansar o projeto de libertação do Cristo ressuscitado.
Surgem, então, “assalariadamente e com pouco apoio”, as pastorais sociais que desenvolvem atividades de organização popular, tornando viva a vertente transformadora da Igreja, através de romarias, congressos, projetos, seminários, campanhas etc.

Os intereclesiais, surgem no cenário contribuindo para o revigorar das comunidades, neles se reafirmam as bandeiras de luta da fraternidade, igualdade e justiça social, onde se coloca o valor real da missão que nasce do próprio Deus que, em Jesus, se fez “Deus conosco.” Dentro destes aspectos da missão, alimentados nas instâncias de organização das CEBs, é propício salientar quanto é preciso passar de uma visão em que a Igreja está no centro do nosso trabalho para uma consciência de que o centro de tudo é o Reino de Deus e que a Igreja está a serviço deste Reino. A comunidade eclesial não vive para si, ela não está e nem deve se colocar no centro. Ela vive a serviço do Reino que é o centro e a meta de todas as suas atividades e reflexões. Para os que vivem na espiritualidade das CEBs, reviver o passado é impossível, porém pressionar a atual conjuntura eclesial é mais do que uma exigência, é uma necessidade emergente que visa novamente responder as eminentes crises que nunca abandonaram o cenário social.

Contudo ainda encontramos em nossas comunidades leigos e leigas que permanecem fieis aos critérios da libertação preconizadas pelo mestre Jesus em seu evangelho, renovados em função da constante leitura dos tempos, resistentes aos marcos do desenvolvimento, tratando das macro questões que modernizaram as formas de explorar o povo, ampliando o quadro de excluídos.

Por tudo isso somos as CEBs missionárias, discípulas do Cristo libertador, evangelizadas para incidir na vida do povo, para perpetuar a vitalidade do Evangelho, partir o pão da vida entre os empobrecidos contrapondo o comportamento econômico mundial que submete o homem a uma vida indigna e distante do sonho de Deus “que todos tenham vida e vida em abundância”.
Somos gente renovada espalhadas pelo mundo, somos as CEBs de Jesus.
Carlos Jardel dos Santos
Diocese Tianguá